Tuesday, April 22, 2014

Senhora do Leste

Perdido em ti
Eu me desvendo
Dou-me aos passos
E te congestiono
Tuas artérias
Sempre inflamadas
E sou bombeado
Do teu coração
E faço de ti prisão
Abraças-me
Arranhas-me
És a maldição
E a redenção
Perdido em mim
Desvendo-te
Vomito nas tuas passarelas
Mijo nas tuas flores
Trepo-te nos teus amores
Nas tuas multiplicações
Nas tuas encruzilhadas
Nas noites embriagadas
Tens as garras
E o encanto
Eu só tenho o vício
E o tempo
Eu me perco
Se te encontro
Viver em ti
É cortejar a morte
E desprezar a sorte
É zerar o tempo
E congelar o medo
Tua aurora de fogo
Teu semblante afiado
O teu ventre fecundo
hordas de vagabundos
Acobertada
Pelo teu manto branco
E aquecida
No recanto dos teus membros
Em cada poro da tua pele
Antros da perdição
Por onde transpiram
Os teus sabores
Nos teus licores
Pelos teus seios
Em Vinohrady
Escorrego ao umbigo
Em Staromák
Atravesso-te o cinto
Pelas tuas pontes
Forço-te a entrada
em Divoká Šarka
E nos teus fluídos
Eu me deslizo
E faço um dueto
Com o pica-pau-preto
E subo ao teu rosto
Em Hostivař
Para, num beijo
Eu me afogar
E vagueando por ti
Eu me desvendo
Mesmo perdendo
O rumo do tempo
E desnorteado
Eu mesmo me rendo
Porque ainda sem guia
Seja noite ou dia
És a melhor companhia
Onde a inspiração renasce
E a solidão aprimora
O compasso que erra
Num caminho de pedra.



Nota: a senhora, de garras e semblante afiado, só poderia ser a musa de Kafka.

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