Friday, November 8, 2013

Quatro Paredes

Poucas pessoas se dão conta da vastidão entre quatro paredes. Ainda menos são as que se apercebem da luz gerada em sua escuridão. Quantas viagens são feitas às profundezas da alma, quantas visões macro fazemos da vida, dos seus fragmentos, seus detalhes aparentemente mais insignificantes. Quanto custa fazer a revelação da nossa essência? O exercício humano mais sublime é adentrar-se dolorosamente a si próprio. É a queda livre no abismo da alma que nos proporciona uma viagem onírica aos confins da vida. A solidão da madrugada, a insônia da ansiedade, o sufoco da própria existência. Não há nada mais cruel do que a própria vida sentida na sua crueza. As quatro paredes são o resumo do mundo inteiro. Imagine se pudéssemos materializar tudo o que passa por elas em forma de pensamento; a dita cuja dos nossos corações, a matéria de um exame, o vizinho mal-encarado, as ambiências musicais, as memórias de ontem, os fantasma de hoje e o medo do amanhã. É na solidão das quatro paredes que somos nós próprios. Para a maioria das pessoas é o único momento de verdade em que são elas próprias e não personagens fajutas. As paredes são opacas à mentira. Recebem-na e nos refletem de volta. Não há como fugir da realidade quando vasculhamos as próprias entranhas, quando descobrimos os nossos próprios segredos. O maior perigo da vida reside na maturidade intelectual e na lucidez. Elas sufocam-nos. Estivéssemos sempre embriagados, a la Baudelaire, não temeríamos adentrarmo-nos porque seríamos feitos de embriaguez, de loucura. A loucura é a única salvação para as querelas da mente; todo o resto é autoflagelação. Quanto mais divagamos, quanto mais questionamos e quanto mais descobrimos, mais dor sentimos, mais perdidos ficamos. Ignorantes não tendem à melancolia. A vida fútil é a proteção natural dos covardes que não se encaram sequer a si próprios, quanto mais ao mundo que os rodeia. As paredes dos seus quartos teimam em lembrar-lhes disso diariamente, mas há quem tenha o dom da indiferença. Sim, a indiferença é um dom! A sensibilidade é uma maldição! As paredes do meu quarto são indiferentes. Nunca as vi chorar, nunca as vi lamentar, nunca as vi deprimidas. Estão sempre imponentes, fortes e duras. Sempre frias. Sempre silenciosas. Ouvem muito e me respondem sem qualquer piedade.

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